quinta-feira, 31 de março de 2016

BALANÇO PATRIMONIAL NAS LICITAÇÕES

por Simone Zanotello de Oliveira
 
O inciso I, do art. 31 da Lei 8.666/93, que trata da documentação relativa à qualificação econômico-financeira nas licitações, dispõe sobre a possibilidade de apresentação de “balanço patrimonial e demonstrações contábeis do último exercício social, já exigíveis e apresentados na forma da lei, que comprovem a boa situação financeira da empresa, vedada a sua substituição por balancetes ou balanços provisórios, podendo ser atualizados por índices oficiais quando encerrado há mais de 3 (três) meses da data de apresentação da proposta.”
Portanto, a saúde financeira da empresa poderá ser verificada pela análise do balanço a ser por ela apresentado. Todavia, essa análise não poderá ser aleatória ou subjetiva, devendo se basear na verificação de índices contábeis. O próprio § 5º. do mesmo artigo prescreve que a comprovação de boa situação financeira da empresa será feita de forma objetiva, através do cálculo de índices contábeis previstos no edital e devidamente justificados no processo administrativo da licitação que tenha dado início ao certame licitatório, vedada a exigência de índices e valores não usualmente  adotados para correta avaliação de situação financeira suficiente ao cumprimento das obrigações decorrentes da licitação. Ainda no § 1º. desse mesmo artigo, há prescrição de que a exigência de índices deverá se limitar à demonstração da capacidade financeira do licitante com vistas aos compromissos que terá que assumir caso lhe seja adjudicado o contrato, sendo vedada a exigência de valores mínimos de faturamento anterior, índices de rentabilidade ou lucratividade.
Verifica-se por meio dos dispositivos citados, que a legislação não estabelece quais índices deverão ser utilizados, fazendo apenas a vedação de alguns. Nesse caso, a escolha desses índices, além das disposições anteriores, deverá ser pautada pela razoabilidade e pela proporcionalidade. Atualmente, os índices mais comuns solicitados em editais pelos órgãos, que possuem aprovação pelas cortes de contas, são: “índice de liquidez geral”, “índice de liquidez corrente” e “índice de solvência geral”, que podem variar de 1 a 1,5; e “grau de endividamento”, que poderá variar de 30 a 60. É importante destacar que quando o montante dos índices solicitados sai da razoabilidade ou da proporcionalidade, poderemos ter duas consequências: ou a contratação de empresa sem saúde financeira (na hipótese de índices muito baixos) ou o afastamento dos licitantes do certame por exigências não passíveis de serem cumpridas (na ocorrência da solicitação de índices muito altos). Portanto, a virtude está no meio.
 
Outra questão também importante com relação ao balanço, trata-se da sua apresentação por microempresas e empresas de pequeno porte, visto que elas estão dispensadas de sua elaboração para efeitos tributários, por conta dos dispositivos da Lei Complementar n. 123/06. Embora seja uma questão controvertida, doutrina e jurisprudência têm admitido a solicitação de balanço nas licitações também para ME e EPPs, com a justificativa de que a dispensa de elaboração e apresentação é apenas para fins tributários, e não administrativos, podendo o órgão efetuar a solicitação, cabendo a ME ou EPP confeccioná-lo para fins de participação no certame.
 
Por outro lado, destacamos que o Decreto Federal 8.538/15, que regulamenta o tratamento favorecido, diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte (e outras) nas contratações públicas de bens, serviços e obras, no âmbito da administração pública federal, estabelece em seu art. 3º., que na habilitação em licitações para o fornecimento de bens para pronta entrega ou para a locação de materiais, não será exigida da microempresa ou da empresa de pequeno porte a apresentação de balanço patrimonial do último exercício social.
 
Por fim, empresas recém-constituídas não terão condições de apresentar o seu balanço completo, visto não terem concluído seu primeiro exercício. Nesse caso, logicamente elas não estarão impedidas de participar no certame, podendo, portanto, apresentar o balanço de abertura devidamente registrado na Junta Comercial.
 
 

quarta-feira, 9 de março de 2016

CONSÓRCIOS NA LICITAÇÃO


por Simone Zanotello de Oliveira
 
          O consórcio representa uma associação entre sociedades para a obtenção de uma finalidade comum ou a execução de um empreendimento específico. Não possui, em tese, personalidade jurídica e as consorciadas somente se obrigam nas condições previstas no respectivo contrato. No caso das licitações, caberá ao gestor, por meio do edital, permitir ou vedar a participação de empresas sob a forma de consórcio. Nesse caso, embora seja uma decisão discricionária, ela deverá estar pautada por algumas premissas, numa análise do caso concreto. As licitações com objeto mais abrangente, que exijam habilidades diversas, as quais dificilmente seriam executadas por uma só empresa, bem como aquelas que apresentem valores mais significativos, devem permitir a participação de empresas sob a forma de consórcio, com o objetivo de ampliar a competitividade do certame. Nas demais, poderá haver a vedação. Nesse sentido, vejamos os precedentes jurisprudenciais sobre o tema:

 
TCU – Acórdão n.º 1165/2012-Plenário, TC 037.773/2011-9, rel. Min. Raimundo Carreiro, 16.5.2012. (...) Segundo o MI, “a participação de empresas sob a forma de consórcio envolveria a discricionariedade da Administração”, sendo que, conforme precedente jurisprudencial do TCU, “o juízo acerca da admissão ou não de empresas consorciadas na licitação dependerá de cada caso concreto”. Ao concordar com a alegação apresentada, o relator registrou em seu voto que “há que se demonstrar com fundamentos sólidos a escolha a ser feita pelo gestor durante o processo de licitação no que toca à vedação da participação de consórcios, ou mesmo à sua autorização”.

 
TCU - Acórdão n.º 2898/2012-Plenário, TC-026.382/2012-1, rel. Min. José Jorge, 24.10.2012. - O impedimento de participação de consórcios de empresas em licitação de obra de elevada complexidade e grande vulto restringe o caráter competitivo do certame. (...) O Tribunal, então, ao acolher proposta do relator, decidiu: (...) b) determinar à XXX que, em futuros certames, admitida a formação de consórcio quando o objeto do certame “envolver questões de alta complexidade e de relevante vulto, em que empresas, isoladamente, não tenham condições de suprir os requisitos de habilitação do edital, com vistas à ampliação da competitividade e à obtenção da proposta mais vantajosa, em atendimento ao art. 3º, § 1º, inciso I, da Lei 8.666/1993...”. Precedentes mencionados: Acórdãos 22/2003, 1094/2004, 1672/2006 e 1417/2008, todos do Plenário.
 
 
          A formação dos consórcios deverá seguir as diretrizes do art. 33 da Lei 8.666/93, sendo permitida inclusive nos pregões. O edital deverá dispor exigências documentais específicas, para fins de habilitação, com as seguintes diretrizes:
- as empresas deverão apresentar um compromisso público ou particular de constituição de consórcio na hipótese de se sagrarem vencedoras do certame;
- a indicação da empresa que será a líder do consórcio, sendo que na hipótese da formação de consórcio com empresas brasileiras e estrangeiras, a liderança deverá obrigatoriamente ficar com uma empresa brasileira;
- a apresentação de toda a documentação de habilitação exigida no edital, por parte das consorciadas, salientando que no caso de qualificação técnica admitir-se-á a somatória dos quantitativos de cada consorciado, e que para a qualificação econômico-financeira também é possível o somatório dos valores de cada consorciado, na proporção de sua respectiva participação, podendo a Administração estabelecer um acréscimo de 30% dos para a verificação dessa capacidade, exceto se o consórcio for composto, na sua totalidade, por micro e pequenas empresas.

 
          Haverá impedimento de que uma empresa consorciada participe de outro consórcio ou até mesmo isoladamente, numa mesma licitação. Ademais, a Lei 8.666/93 define uma responsabilidade solidária dos integrantes do consórcio. A Administração não deverá estipular em edital o número mínimo ou máximo de integrantes do consórcio, a menos que haja alguma justificativa para tanto, sob pena de promover uma ingerência nas atividades das empresas. Esse é o posicionamento do TCU, conforme decisão a seguir:  
 
 
TCU - Acórdão 718/2011 – Plenário – Rel. Min. Valmir Campelo Costa – Quando permitida a participação em licitação de empresas em consórcio, só será aceita limitação quanto ao número destas em casos excepcionais, com a devida justificativa. (...) Todavia, no caso concreto, para a unidade técnica seria “perfeitamente aceitável a limitação do número de empresas consorciadas, em caráter excepcional, impedindo a pulverização de responsabilidades”, considerando-se, ademais, a importância das obras, necessárias à infraestrutura aeroportuária para a Copa do Mundo de 2014.
 
          Concluída a licitação, o licitante vencedor fica obrigado a promover, antes da celebração do contrato, a constituição e registro do consórcio, nos termos do compromisso oferecido no momento da licitação. No que tange à forma de registro, a lei silencia a respeito. Atualmente, podemos ter o registro do consórcio em Cartório (para contrações de menor vulto), o registro na Junta Comercial (que acaba sendo a opção mais comum – nesse caso, o consórcio passa a ter um CNJP, embora não haja a constituição de uma nova pessoa jurídica) ou, ainda, a transformação do consórcio numa Sociedade de Propósito Específico – SPE, que nesse caso deverá contar com registro na Junta Comercial e irá se constituir numa pessoa jurídica independente (mais indicado para contratações de grande vulto, com prazos significativos de execução).