por Simone Zanotello de Oliveira
Sabemos que a regra geral que disciplina as contratações públicas
tem como premissa a obrigatoriedade da realização de licitação para a aquisição
de bens e a execução de serviços e obras. No entanto, como em toda regra há
exceções, e não seria diferente com a Lei de Licitações, esse diploma legal
dispõe algumas hipóteses nas quais a obrigatoriedade de realizar licitação
estará afastada.
Doutrinariamente, podemos classificar essas hipóteses em três
figuras distintas: a licitação dispensada, a licitação dispensável e a inexigibilidade de licitação. Primeiramente, vamos nos ater às
diferenças entre licitação dispensável
e licitação dispensada. Na licitação
dispensável, o administrador, se quiser, poderá realizar o procedimento
licitatório, sendo, portanto, uma faculdade. Com relação à licitação
dispensada, o administrador não
pode licitar, visto que já se tem a definição da pessoa com quem se firmará o
contrato.
Portanto, na licitação
dispensada não existe a faculdade para se realizar a licitação, enquanto
que na licitação dispensável essa
alternativa é possível, cabendo ao administrador fazer a análise do caso
concreto, inclusive com relação ao custo-benefício desse procedimento e a bem
do interesse público, levando-se em conta o princípio da eficiência, pois, em
certas hipóteses, licitar pode não representar a melhor alternativa.
Já a inexigibilidade de licitação refere-se aos casos em que o administrador não tem a faculdade
para licitar, em virtude de não haver competição ao objeto a ser contratado,
condição imprescindível para um procedimento licitatório.
No
que tange à figura da licitação dispensável,
como já exposto, a Administração tem a faculdade de não realizar o procedimento
licitatório para algumas hipóteses. As situações nas quais a licitação é
dispensável encontram-se indicadas no art. 24, da Lei Federal n. 8.666/93, que atualmente conta
com 34 incisos.
Agora,
vamos nos ater ao inciso IV do art. 24, que dispõe que a licitação será
dispensável:
IV - nos casos de emergência ou
de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação
que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras,
serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para
os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para
as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de
180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência
da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos.
Iniciemos
pela calamidade pública. Ela tem origem em ações da natureza, como inundações,
terremotos, vendavais, epidemias, dentre outras, que atingem a população,
trazendo consequências desastrosas à saúde, aos bens, às atividades, etc. No
entanto, para que seja possível a utilização desta hipótese de dispensa de
licitação, é preciso que o Executivo declare esse estado de calamidade, via
decreto, embasando, por consequência, essas contratações.
Já
os casos de emergência caracterizam-se pela necessidade imediata de resolução
de um problema que possa trazer prejuízos à população, comprometendo sua
segurança e pondo em risco obras, bens, serviços, etc. Se a Administração
Pública não agir, poderá ser considerada omissa, inclusive respondendo no
âmbito criminal. Entretanto, o estado de emergência deve caracterizar uma
situação imprevisível, que exige um atendimento imediato, e não uma ausência de
planejamento e de gestão administrativa.
Diante
dessa assertiva, durante muito tempo o Tribunal de Contas da União
manifestou-se pela irregularidade das contratações emergenciais provocadas pela
omissão do Poder Público. Vejamos:
TCU – Decisão 397/96 – A
alegação de emergência é descabida quando a Administração não adota, no prazo
hábil, as medidas necessárias para realizar a licitação. (Outros Acórdãos no
mesmo sentido: Acórdão 260/2002 – Plenário, Acórdão 348/2003 – 2ª. Câmara,
Acórdão 771/2005 – 2ª. Câmara)
TCU – Acórdão 224/07 –
Plenário – Não vale como justificativa para a contratação por dispensa de
licitação a situação emergencial previsível e provocada pela inação do próprio
poder público.
TCU – Acórdão 7.557/2010
– 2ª. Câmara – O planejamento inadequado por parte da Administração afasta a
possibilidade de contratação emergencial, com fundamento no art. 24, inc. IV,
da Lei 8.666/93.
No entanto, uma decisão
importante sobre o tema foi prolatada pelo TCU, por meio do
Acórdão 2240/15 – Primeira Câmara, TC 019.511/2011-6, de relatoria do
Ministro Benjamin Zymler (em 28.4.2015), cuja leitura recomendamos, no sentido
de que a dispensa de licitação também se mostra possível quando a
situação de emergência decorrer da falta de planejamento, da desídia
administrativa ou da má gestão dos recursos púbicos. O entendimento pauta-se na
ideia de que a inércia do gestor, culposa
ou dolosa, não pode vir em prejuízo de interesse público maior tutelado pela
Administração, posição que concordamos.
Por outro lado, o julgado
também deixa claro que nessas situações, entretanto, o reconhecimento da situação de emergência não implica convalidar ou
dar respaldo jurídico à conduta omissiva do administrador, a quem cabe a
responsabilidade pela não realização da licitação em momento oportuno.
Portanto, as ações para apuração de
responsabilidade deverão ser adotadas pela Administração nessa hipótese.
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