quinta-feira, 15 de setembro de 2016

LICITAÇÃO DISPENSÁVEL EM CASOS DE EMERGÊNCIA OU CALAMIDADE PÚBLICA – POSICIONAMENTO DO TCU

por Simone Zanotello de Oliveira 


Sabemos que a regra geral que disciplina as contratações públicas tem como premissa a obrigatoriedade da realização de licitação para a aquisição de bens e a execução de serviços e obras. No entanto, como em toda regra há exceções, e não seria diferente com a Lei de Licitações, esse diploma legal dispõe algumas hipóteses nas quais a obrigatoriedade de realizar licitação estará afastada.

Doutrinariamente, podemos classificar essas hipóteses em três figuras distintas: a licitação dispensada, a licitação dispensável e a inexigibilidade de licitação. Primeiramente, vamos nos ater às diferenças entre licitação dispensável e licitação dispensada. Na licitação dispensável, o administrador, se quiser, poderá realizar o procedimento licitatório, sendo, portanto, uma faculdade. Com relação à licitação dispensada, o administrador não pode licitar, visto que já se tem a definição da pessoa com quem se firmará o contrato.

Portanto, na licitação dispensada não existe a faculdade para se realizar a licitação, enquanto que na licitação dispensável essa alternativa é possível, cabendo ao administrador fazer a análise do caso concreto, inclusive com relação ao custo-benefício desse procedimento e a bem do interesse público, levando-se em conta o princípio da eficiência, pois, em certas hipóteses, licitar pode não representar a melhor alternativa.

Já a inexigibilidade de licitação refere-se aos casos em que o administrador não tem a faculdade para licitar, em virtude de não haver competição ao objeto a ser contratado, condição imprescindível para um procedimento licitatório.

No que tange à figura da licitação dispensável, como já exposto, a Administração tem a faculdade de não realizar o procedimento licitatório para algumas hipóteses. As situações nas quais a licitação é dispensável encontram-se indicadas no art. 24, da  Lei Federal n. 8.666/93, que atualmente conta com 34 incisos.

Agora, vamos nos ater ao inciso IV do art. 24, que dispõe que a licitação será dispensável:

IV - nos casos de emergência ou de calamidade pública, quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa e para as parcelas de obras e serviços que possam ser concluídas no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias consecutivos e ininterruptos, contados da ocorrência da emergência ou calamidade, vedada a prorrogação dos respectivos contratos.

Iniciemos pela calamidade pública. Ela tem origem em ações da natureza, como inundações, terremotos, vendavais, epidemias, dentre outras, que atingem a população, trazendo consequências desastrosas à saúde, aos bens, às atividades, etc. No entanto, para que seja possível a utilização desta hipótese de dispensa de licitação, é preciso que o Executivo declare esse estado de calamidade, via decreto, embasando, por consequência, essas contratações. 

Já os casos de emergência caracterizam-se pela necessidade imediata de resolução de um problema que possa trazer prejuízos à população, comprometendo sua segurança e pondo em risco obras, bens, serviços, etc. Se a Administração Pública não agir, poderá ser considerada omissa, inclusive respondendo no âmbito criminal. Entretanto, o estado de emergência deve caracterizar uma situação imprevisível, que exige um atendimento imediato, e não uma ausência de planejamento e de gestão administrativa.

Diante dessa assertiva, durante muito tempo o Tribunal de Contas da União manifestou-se pela irregularidade das contratações emergenciais provocadas pela omissão do Poder Público. Vejamos:

TCU – Decisão 397/96 – A alegação de emergência é descabida quando a Administração não adota, no prazo hábil, as medidas necessárias para realizar a licitação. (Outros Acórdãos no mesmo sentido: Acórdão 260/2002 – Plenário, Acórdão 348/2003 – 2ª. Câmara, Acórdão 771/2005 – 2ª. Câmara)

TCU – Acórdão 224/07 – Plenário – Não vale como justificativa para a contratação por dispensa de licitação a situação emergencial previsível e provocada pela inação do próprio poder público.

TCU – Acórdão 7.557/2010 – 2ª. Câmara – O planejamento inadequado por parte da Administração afasta a possibilidade de contratação emergencial, com fundamento no art. 24, inc. IV, da Lei 8.666/93.


No entanto, uma decisão importante sobre o tema foi prolatada pelo TCU, por meio do Acórdão 2240/15 – Primeira Câmara, TC 019.511/2011-6, de relatoria do Ministro Benjamin Zymler (em 28.4.2015), cuja leitura recomendamos, no sentido de que a dispensa de licitação também se mostra possível quando a situação de emergência decorrer da falta de planejamento, da desídia administrativa ou da má gestão dos recursos púbicos. O entendimento pauta-se na ideia de que a inércia do gestor, culposa ou dolosa, não pode vir em prejuízo de interesse público maior tutelado pela Administração, posição que concordamos.


Por outro lado, o julgado também deixa claro que nessas situações, entretanto, o reconhecimento da situação de emergência não implica convalidar ou dar respaldo jurídico à conduta omissiva do administrador, a quem cabe a responsabilidade pela não realização da licitação em momento oportuno.   

Portanto, as ações para apuração de responsabilidade deverão ser adotadas pela Administração nessa hipótese.

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